Conforme a Profa. Dra. Rita Charon, da Universidade de
Columbia, a Medicina Narrativa é uma medicina praticada com competência narrativa para reconhecer,
absorver, interpretar e ser tocado pelas histórias (estórias) de doenças (e de
doentes).
A Medicina Narrativa busca:
-
Aumentar a capacidade de percepção clínica.
-
Levar a um cuidado mais humano, mais ético e mais
efetivo.
A Medicina Narrativa provém dos
seguintes campos:
- Humanidades e Medicina
- Cuidados Primários em Medicina
- Narratologia contemporânea (que é o estudo de estruturas e de elementos das narrativas)
- Estudos de relação
médico-paciente.
- Literatura e Medicina
- Cuidado centrado no vínculo
indivíduo/comunidade/profissional da saúde
O estudo da Medicina diz respeito
ao estudo do ser humano.
Tudo o que se estuda em Medicina, e
além dela, vai, gradativamente,
configurando o que se entende por “ser humano”.
Profissionais da saúde precisam de
meios para:
-
Singularizar o cuidado ao paciente
-
Reconhecer/perceber a ética profissional e os deveres pessoais ao doente
-
Produzir “correlações terapêuticas” com pacientes, entre
profissionais e com o público.
Hoje em dia, a falta de singularidade, humildade, responsabilidade,
empatia pode ser provida, em parte, pela Medicina Narrativa.
A atividade da medicina narrativa é
compatível com uma prática multiprofissional.
O que é multiprofissional pode ser multidisciplinar ou
interdisciplinar. Cada um desses conceitos tem suas particularidades e tem suas
intersecções.
Multidisciplinaridade: é o que
já está presente desde Aristóteles. Corresponde a cada
área do Conhecimento com sua linguagem e seu método.
Interdisciplinaridade: permite
uma permuta de linguagens e de métodos, ou ainda a adoção da mesma linguagem e
método por diferentes campos do Conhecimento.
Transdisciplinaridade: diz respeito mais a uma “metalinguagem” e “metamétodos”, ou seja,
transversaliza diferentes campos do Conhecimento, mas ao mesmo tempo sem o tipo
de envolvimento da interdisciplinaridade, já que aborda “linguagem e método” do
“lado de fora”, ou seja sem submeter-se às condições e normas de linguagem e
método dos campos. A transdisciplinaridade também inclui “culturalidade”, ou seja, admite no
processo de Conhecimento as variáveis culturais. Também a
transdisciplinaridade, por suas características, concilia paradoxos.
São 3 os pilares da
transdisciplinaridade:
1 –Níveis de Realidade.
Deve-se admitir que a abordagem do
Real pode acontecer em diferentes níveis de realidade, de modo que em cada
nível há condições próprias. Não se pode reduzir todo o fenômeno a apenas um
nível de realidade. Assim, este pilar também propõe uma atitude de “anti-reducionismo”. Se, por exemplo, levarmos para o âmbito do ser
humano, podemos ver que “ser humano” não se reduz ao nível da realidade
biológica, mas há outros níveis de realidade, como cultural, social, entre
outros, que vão compor a realidade do indivíduo.
2 – Complexidade.
A Complexidade também é
anti-reducionista.
Uma forma de entender a
complexidade é a frase:
“O todo é mais do que a soma das
partes”. Assim, mesmo que se juntem
todas as partes não se tem um todo. Isso porque o todo implica em alguma coisa
a mais do que apenas se ter as partes. Passa a estar presente também o vínculo
entre as partes, os fatores que unem as partes, a energia, os desdobramentos
provenientes da existência desse todo que articula essas partes.
3 – Terceiro incluído.
O terceiro incluído segue uma
lógica diferente do “terceiro excluído”. Neste, em uma configuração lógica onde
A e B não se correlacionam, o terceiro excluído corresponde a um não-A e não-B.
Já no terceiro incluído não-A e
não-B pode implicar em um C que possa harmonizar não-A e não-B em convivência
simultânea. Os autores dão como exemplo dessa situação a conceituação física
quântica de “quanta”. Isso acaba resolvendo a dicotomia entre as possibilidades
de um fóton ser partícula ou de ser onda. No quanta essas duas possibilidades
convivem em um nível de realidade acima de ambos. Assim admite paradoxos. Vai além dos pares de opostos.
Como uma espécie de quarto pilar
temos a culturalidade já citada.
A Medicina Narrativa é:
-
Um reforço à anamnese tradicional
-
Uma recuperação do valor dessa anamnese no século
21.
-
Educa uma escuta focada e o olho clínico que direcionam as decisões baseadas em evidência.
Protocolos médicos são boas
ferramentas em mãos de quem raciocina a respeito de sua aplicação, adapta-os à singularidade do paciente e de sua cultura.
Isso é possível a partir de uma boa
anamnese, e do exercício narrativo.
A Medicina Narrativa pode aprimorar
no profissional de saúde a percepção de quando e quanto deve acrescentar de
dados à anamnese, permitindo conhecer aspectos da vida do paciente que podem
interferir no processo saúde/doença, e usualmente passam despercebidos.
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