As palavras
Multidisciplinaridade, Interdisciplinaridade e Transdisciplinaridade passaram a
circular em ambientes relacionados a estudos do Conhecimento e da Educação
principalmente a partir da década de 1990. Tais termos passaram a ser muito
utilizados na linguagem cotidiana desses e de outros campos de estudo, de tal
modo que acompanharam até mesmo certo modismo nos discursos em torno desses
temas e de temas similares.
Cada palavra carrega diversos
elementos além do seu significado básico inicial. Esses elementos podem ser
tanto racionais quanto emotivos e podem despertar atração ou repulsão
dependendo do contexto em que o termo esteja sendo usado, ou seja, dependendo
de espaço, tempo e do agrupamento humano que faça uso do termo específico.
Talvez por conta da força do
próprio prefixo “multi”, que sinaliza algo próspero, crescente, positivo,
progressivo, o termo “multidisciplinar” frequentemente é usado para além de seu
significado original. Não queremos dizer com isso que esse uso esteja errado.
As palavras têm diversos sinônimos e significados dependendo do ambiente em que
estejam sendo usadas. No entanto, tem havido algum engano no uso da palavra “multidisciplinar”
por se estar querendo dizer alguma coisa que talvez tenha melhores palavras para
descrever, como, por exemplo, “interdisciplinaridade”, ou eventualmente pela
descoberta da palavra “multidisciplinaridade” por alguém que tenha certo
encanto pela sonoridade e pela aparente praticidade que a palavra pode
proporcionar, ou ainda por ser uma palavra que possa engrandecer a atividade ou
a pessoa que a aplique, bem como por certa sensação de modernidade ou
contemporaneidade ao pronunciar ou escrever “multidisciplinaridade”.
Como multidisciplinaridade reúne o
prefixo “multi”, de origem grega e a raiz “disciplina”, de origem latina, os
franceses preferem o termo “pluridisciplinaridade”. Na verdade, ambos dizem
respeito à mesma coisa.
Com certa frequência alguém diz
que “agora aqui já somos multidisciplinares”, ou “agora adotamos a
multidisciplinaridade”. Isso pode ser verdade se o local em questão tiver sido
apenas “unidisciplinar” anteriormente. Nem sempre é esse o caso.
Embora o uso desse termo tenha
começado na segunda metade do século XX, podemos dizer que a
multidisciplinaridade tenha começado com Aristóteles. Devemos frisar que o
próprio Aristóteles não tinha como se considerar “multidisciplinar”, haja vista
ser esse um conceito de nossos tempos. No entanto, na cultura ocidental, ele
foi o primeiro que estabeleceu de maneira mais regularizada, ou organizada, a
divisão de áreas do Conhecimento. Certamente ele foi precedido por outros que
também tinham certa divisão de campos do Conhecimento. Se formos nos reportar
aos primórdios mais longevos da humanidade a respeito de quando teria se
iniciado a divisão de Conhecimento, iremos até o Período Paleolítico da
Pré-História, na assim chamada cultura de “caçador-coletor”, onda já havia uma
divisão de trabalho e, portanto de conhecimento entre dois grupos: homens
caçadores de animais, mulheres coletoras de materiais vegetais diversos. Essa
divisão de trabalho propiciou um gradual aprimoramento de cada um desses grupos
na sua própria área de conhecimento, de modo que a partir de certo ponto
passaram a ter noção de refinados e detalhados fatores de suas áreas respectivas,
incluindo até determinados “segredos” da arte de cada uma dessas áreas. Isso
certamente acabou levando a um processo de “iniciação” das pessoas mais jovens,
com etapas de aquisição de conhecimento desde a infância e a partir de certa
idade com “rituais de passagem”, indicando a possibilidade de prosseguir na
aquisição de conhecimento e sua aplicação prática.
Se assim era na Pré-História,
mais refinado passa a ser quando o Conhecimento se torna sistematizado e
organizado, principalmente a partir dos filósofos, quando falamos de Ocidente,
e, de certa forma, culminando com Aristóteles como um organizador algo formal
desse Conhecimento. Evidentemente o processo não para por aí. Mas, entre os
filósofos anteriores a Aristóteles e ele próprio, podemos propor que ele tenha
sido o primeiro a relacionar as áreas do Conhecimento, de modo que sejam
similares a aquilo que denominamos “multidisciplinaridade”.